segunda-feira, 2 de março de 2009

O conhecimento pode ser comunicado, mas a sabedoria, não. Uma pessoa pode encontrá-la, vivê-la, ser fortificada por ela, operar maravilhas por seu intermédio, tudo menos comunicá-la e ensiná-la. Desconfiei disso quando ainda era novo e foi isso que me afastou dos mestres.

Eu sou um pecador e tu és outro, mas um dia o pecador alcançará o Nirvana, um dia tornar-se-à um Buda. Este “um dia” é uma ilusão. O pecador não vai a caminho de um estado búdico. Não, o Buda potencial já existe no pecador. O mundo não é imperfeito nem evolui lentamente por um caminho que conduz à perfeição. Não, é perfeito em todos os seus momentos, cada pecado já traz a graça consigo, todas as crianças são velhos potenciais, todos os bebés já têm a morte dentro deles, todos os moribundos já têm consigo a vida eterna. O Buda existe no ladrão e no jogador de dados; o ladrão existe no brâmane. Tudo quanto existe é bom – a morte como a vida, o pecado como a santidade, a sensatez como a leviandade. Tudo é necessário, tudo necessita apenas do meu consentimento, da minha terna compreensão; assim, tudo estará bem em mim e nada me poderá prejudicar. Aprendi através do corpo e da Alma ser necessário que eu pecasse, que precisasse da luxúria, que tivesse de lutar para acumular bens e sentir náusea e desespero profundo, a fim de aprender e não lhes resistir, a fim de aprender a amar o mundo e a deixar de compará-lo com qualquer espécie de desejado mundo imaginário, com qualquer visão imaginária da perfeição. O essencial era deixá-lo como é, amá-lo e sentir-me feliz por lhe pertencer.

As palavras não exprimem muito bem os pensamentos. Estes tornam-se sempre um pouco diferentes logo após serem exprimidos, um pouco deformados, um pouco idiotas. Também me agrada, e parece certo, que pareça a um homem idiotice o que a outro parece ter valor e sabedoria. Para ser franco também não atribuo grande importância aos pensamentos. Atribuo mais importância às coisas. As acções e a vida são mais importantes que as palavras, o gesto da mão mais importante que as suas opiniões. Não é pelas suas palavras, ou pelos seus pensamentos, que se é considerado um grande homem e, sim, pelos seus actos e pela sua vida.
Hermann Hesse

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